No último mês, dia 09 de novembro, morreu Gal Costa, aos 77 anos, uma figura central para a música brasileira.
Ela iniciou sua carreira na década de 1960 e participou do movimento tropicalista, atuando em oposição à ditadura militar. Nesse período, ela teve álbuns censurados pelo regime. A arte de Luiz Jasmin (imagem 1) foi censurada do encarte do primeiro disco de Gal Costa, em 1969, e seu disco Índia, lançado em 1973, foi vendido em uma embalagem preta lacrada, por apresentar na capa considerada contra os “bons costumes” (imagem 2).

Imagem 1 – Arte de Luiz Jasmin para o disco Gal

Fonte: O Globo (2022)

Imagem 2 – Capa do álbum Índia (1973)

Fonte: Gal Costa (1973)

Para além de suas produções, marcadas pela liberdade e pela defesa da democracia, Gal Costa se destacou ao longo da carreira por meio de sua atuação política, seus posicionamentos e seu papel de mulher LGBTQIA+ na indústria musical. Em uma realidade marcada pelo machismo como a brasileira, existem inúmeros obstáculos para que mulheres – especialmente mulheres LGBT – alcancem uma posição de destaque no meio artístico. De acordo com a pesquisa AmplifyHer, as mulheres arrecadam apenas 9% das receitas da indústria musical e a discriminação sexual ainda atinge 84% daquelas que conseguem se inserir no mercado, além do problema da hiperssexualização feminina presente em toda a indústria cultural.
Nesse sentido, mesmo sem expor sua vida pessoal, Gal se posicionou a favor da liberdade sexual, contra rótulos e padrões para a sexualidade. Noleto (2014) mostra como as performances da artista, com a peculiaridade e as inspirações de seu canto e o modo de usar a sensualidade e o erotismo, contribuem para que ela seja classificada como a primeira cantora moderna do Brasil, no sentido de ser aberta à versatilidade e à diversidade. Desse modo, a atuação de Gal Costa como única mulher que participou desde a criação do Tropicalismo produziu discussões sobre gênero, liberdade e sexualidade, “trazendo uma adaptação do discurso feminista para dentro de sua performance cênica e servindo também como estratégia de marketing para posicionar a cantora no mercado fonográfico do Brasil” (NOZAKI, 2014, p. 65). Esse discurso feminista defende a independência das mulheres quanto à expressão de sua sexualidade e ao conhecimento do próprio corpo, contra a ideologia patriarcal.
A vida de Gal Costa deve ser lembrada como exemplo de resistência, defesa da democracia e enfrentamento aos padrões de sexualidade por meio da música e da arte, sem medo de se expressar e de se posicionar.

 

Elaboração: Anna Clara Mattos e Alexandre Henrique, sob a orientação de Matheus Arcelo

*O Observatório das Desigualdades é um projeto de extensão. O conteúdo e as opiniões expressas não refletem necessariamente o posicionamento da Fundação João Pinheiro ou do CORECON – MG.

 

Referências
NOLETO, Rafael. “Eu sou uma fruta ‘gogóia’, eu sou uma moça”: Gal Costa e o Tropicalismo no feminino. Per Musi, dez. 2014. Disponível em: <https://www.scielo.br/j/pm/a/cXFZXhwNDgP87PnH5r8F8py/abstract/?lang=pt>. Acesso em: 16 nov. 2022.

AmplifyHer: Voicing the experience of women musicians in Brazil. Sonora, São Paulo, 2021. Disponível em: <http://www.sonora.me/amplifyher-sp/>. Acesso em: 16 nov. 2022.

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