O número de suicídios no Brasil vem aumentando cada vez mais. De acordo com a ABP, CFM e a APAL, “a última pesquisa realizada pela Organização Mundial da Saúde – OMS em 2019, são registrados mais de 700 mil suicídios em todo o mundo, sem contar com os episódios subnotificados, pois com isso, estima-se mais de 01 milhão de casos. No Brasil, os registros se aproximam de 14 mil casos por ano, ou seja, em média 38 pessoas cometem suicídio por dia”. Não podemos desassociar o suicidio de doenças mentais, por esses serem assuntos diretamente relacionados, contudo não possuem grande relevância na sociedade e são pouco debatidos, inclusive por órgãos internacionais. Por exemplo, no documento “Objetivos de Desenvolvimento do Milênio” são abordados a mortalidade infantil, saúde da mulher, infecções sexualmente transmissíveis, malária, etc. como pontos de preocupação para a garantia do desenvolvimento sustentável, contudo pouco é mencionado sobre doenças mentais.
Figura 1 – Prevalência de doenças mentais comuns (% da população)
De acordo com a OMS, o número de pessoas com algum distúrbio ou doença mental vem crescendo principalmente entre os países de baixa renda, como podemos ver na Figura 1, que mostra a incidência de depressão e ansiedade nas regiões do mundo. O gráfico mostra que a porcentagem da população mundial que apresenta depressão é igual a, aproximadamente, 4,5%. A região africana (african region) apresentou a maior incidência, sendo maior inclusive que a média mundial, com aproximadamente 5,4% da sua população possuindo depressão. Em relação a ansiedade, a média mundial é de cerca de 3,6% da população mundial e a região com maior prevalência de ansiedade é o continente americano (region of the americas), com quase 6% da sua população apresentando quadros de ansiedade. Mas o que são doenças mentais?
Mas o que são doenças mentais?
“Os transtornos mentais são tidos como condições clinicamente significativas caracterizadas por alterações do modo de pensar e do humor ou por comportamentos associados com angústia e/ou deterioração do funcionamento pessoal, em uma ou mais esferas da vida, envolvendo os aspectos econômico, social, política e cultural, presentes nas diferentes classes sociais e nas relações gênero” ( Silva e Santana, 2013)
As doenças mentais podem ser tanto consequências de problemas socioeconômicos, como fatores que contribuem para a perpetuação das desigualdades que existem na sociedade. Fatores como emprego, educação, pobreza, habitação, urbanização, discrimanação, culturas são alguns determinantes do nível da saúde mental de um indivíduo, independentemente de qual país ele mora. Na Tabela 1 é possível observar com maior detalhe a relação entre esses fatores e as doenças mentais, mas na maioria desses determinantes, um indivíduo mais vulnerável na sociedade vai estar mais suscetível a desenvolver alguma doença mental, visto que ele possui maior chances de se enquadrar em uma das situações descritas devido a falta de acesso pleno aos serviços públicos e a garantia de seus direitos, que não são amplamente respeitados. Aliado ao estigma negativo que acompanha os transtornos mentais e o suporte para tratamentos ainda insuficiente contribuem para a maior incidência dessas doenças entre as pessoas da classe sociais mais baixas.
Tabela 1 – Relação entre fatores sociais e econômicos e doenças mentais
Fonte: Alves e Rodrigues, 2010.
Mas como funciona essa relação entre doenças mentais e desigualdade? De acordo com Silva e Santana (2013) os pobres possuem maior probabilidade de possuir pior saúde mental, pois estão mais propensos a ter sensações de insegurança e falta de esperança. Isso acaba por afetar a produtividade dessas pessoas, podendo originar custos diretos e indiretos, agravando a situação econômica, criando um círculo virtuoso, como aponta a Figura 2.
Figura 2 – Influência da pobreza sobre a saúde mental
Assim, a pobreza vai ser um fator que aumenta as chances de uma pessoa desenvolver uma doença mental, afetando diretamente a sua rotina. A falta de renda para gastar com o tratamento, contribui para que o indivíduo permaneça nesse estado de saúde. Finalmente, isso vai continuar impactando na sua produtividade e na permanência da sua condição de vulnerabilidade.
Portanto, em um país como o Brasil, onde 63 milhões de pessoas vivem com menos de R$497,00 por mês, 32,2% de sua população com 25 anos ou mais possui até o ensino fundamental completo e 150 milhões de pessoas dependem exclusivamente do SUS, não possuindo plano de saúde, tem-se uma maior vulnerabilidade da população de baixa renda em relação às doenças mentais, aumentando as chances desses indivíduos a entrarem no ciclo vicioso anteriormente apresentado. Isso acaba por contribuir com a perpetuação das desigualdades na sociedade.
Autora: Lorena Auarek, sob a orientação de Bruno Lazzarotti
*O Observatório das Desigualdades é um projeto de extensão. O conteúdo e as opiniões expressas não refletem necessariamente o posicionamento da Fundação João Pinheiro ou do CORECON – MG.
REFERÊNCIAS
ALVES, Ana Alexandra Marinho; RODRIGUES, Nuno Filipe Reis. Determinantes sociais e económicos da Saúde Mental. Revista Portuguesa de Saúde Pública, v. 28, n. 2, p. 127-131, 2010.
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SETEMBRO AMARELO. A campanha Setembro Amarelo Salva vidas!. Disponível em: <https://www.setembroamarelo.com/>
SILVA, Dilma Ferreira; DE SANTANA SANTANA, Paulo Roberto. Transtornos mentais e pobreza no Brasil: uma revisão sistemática. Tempus–Actas de Saúde Coletiva, v. 6, n. 4, p. ág. 175-185, 2012.
WORLD HEALTH ORGANIZATION et al. Depression and other common mental disorders: global health estimates. World Health Organization, 2017.