As questões climáticas estão no centro das discussões globais atualmente. Um ponto importante a ser considerado neste debate é a grande desigualdade que as mudanças climáticas envolvem, seja em suas causas, seja nas consequências.. De um lado, os mais ricos (pessoas e países) são os que mais contribuem para o aquecimento do planeta. De outro, é sobre as mulheres, as pessoas negras, os povos indígenas, as comunidades tradicionais que recaem os principais impactos dos desastres ambientais e das mudanças do clima. 

Além disto, os impactos das mudanças climáticas não são apenas aqueles diretos. Por exemplo, o aumento do custo de vida – com o aumento do preço dos alimentos e de moradia – afeta com mais severidade os mais pobres, enquanto a renda dos mais ricos aumenta a cada dia. 

 

Mais ricos são mais responsáveis pelas emissões

Quando se discute hoje o aquecimento do planeta, um determinante crucial é a emissão de CO2, que retém o calor na atmosfera. Pois bem, a responsabilidade sobre a emissão está longe de ser igualitária. Como ilustra o gráfico 1, os 10% mais ricos da população mundial são responsáveis por 50% de emissões de CO2, de acordo com o Relatório da Oxfam [1]. 

 

Gráfico 1 – Grupos de renda global e emissões de carbono associadas, 2019

Fonte: Oxfam

 

De outro lado, se nos voltamos para empresas e não pessoas, encontramos o peso desproporcional dos investimentos em indústrias altamente poluentes, nas indústrias produtoras de combustíveis fósseis. A Oxfam mostra que 70% das emissões industriais de carbono desde 1998 provêm de apenas 100 produtores de petróleo, carvão e gás [1].

Os países mais ricos também são os maiores causadores da degradação ambiental. Um estudo que analisou o uso de recursos naturais [2] mostra que os países de renda alta são responsáveis por 74% da utilização de recursos que excedem as quotas justas (apenas os Estados Unidos respondem por 27% do uso excessivo), mesmo representando somente 16% da população mundial. 

 

Mais pobres são mais afetados por desastres climáticos

Quando se observam os impactos das mudanças climáticas, porém, o resultao é o inverso. Existe uma enorme desigualdade na forma como estes efeitos são sentidos. A crise do clima vai atingir a todos, mas de forma diferente. Quase metade da população mundial se encontra em uma situação de alta vulnerabilidade às mudanças climáticas, associadas a variáveis como gênero, raça e renda [3]. 

Quando analisamos os efeitos das chuvas, por exemplo, os mais afetados são os moradores de áreas periféricas, que estão sujeitos ao risco geológico e de inundações. As secas também atingem de forma mais acentuada as regiões de maior vulnerabilidade scocio-econômica. O relatório do IPCC [3] ressalta que entre 2010 a 2020 a mortalidade causada por enchentes, secas e tempestades foi 15 vezes maior nas regiões mais vulneráveis do mundo.

Um efeito das mudanças climáticas que merece atenção está relacionado ao aumento da insegurança alimentar e hídrica. As frequentes alterações do clima, com chuvas e secas extremas têm prejudicado a produção de alimentos, principalmente na agricultura familiar, que corresponde a grande parte dos alimentos que chegam à mesa dos brasileiros. Como consequência, o aumento dos preços tem diminuído o poder de compra das famílias mais pobres.

Um relatório do Fórum Humanitário Global [4] também mostra o impacto maior nos países do Sul Global. As alterações climáticas deixam mais de 300 mil pessoas mortas anualmente em todo o planeta, sendo que 99% delas nos países em desenvolvimento. A crise climática gera um prejuízo de 125 bilhões de dólares por ano no mundo todo, mas 90% dessas perdas estão no Sul Global, de acordo com o estudo. 

 

Por uma justiça climática

O enfrentamento às mudanças climáticas, ao que se vê, não é simples, mas exige atitudes concretas e urgentes, que passam muito pelas reduções das desigualdades sócio-econômicas. De um lado, uma tributação adequada sobre os super-ricos e a redistribuição de renda podem ser responsáveis pela promoção de investimentos mais verdes e pela redução das emissões. De outro, o aumento da renda de famílias mais vulneráveis colaboraria para o enfrentamento dos efeitos cotidianos das mudanças climáticas.

A transição energética também é um norte importante e de grande responsabilidade dos países mais ricos, que têm maior capacidade e responsabilidade, mas não cumprem suas metas de redução de emissões. Deve-se compensar também a baixa capacidade dos países sub-desenvolvidos na transição e para atender às necessidades de desenvolvimento, incluindo a falta de acesso à energia.

 

Autores: Alexandre Henrique, sob a orientação do professor Bruno Lazzarotti

 

*O Observatório das Desigualdades é um projeto de extensão. O conteúdo e as opiniões expressas não refletem necessariamente o posicionamento da Fundação João Pinheiro ou do CORECON – MG

 

Referências

[1] https://www.oxfam.org.br/justica-climatica-e-amazonia/igualdade-climatica-um-planeta-para-os-99/

[2] https://www.thelancet.com/journals/lanplh/article/PIIS2542-5196(22)00044-4/fulltext

[3] https://www.ipcc.ch/report/ar6/wg2/downloads/report/IPCC_AR6_WGII_TechnicalSummary.pdf

[4] https://www.ghf-ge.org/human-impact-report.pdf

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